Giseli Silva Aguiar

O mundo e, especialmente o Brasil, vive momentos de extrema dor e sofrimento devido à pandemia da COVID-19 que, em nosso país, já vitimou mais de 650 mil pessoas, as quais deixaram lacunas imensas na vida de suas famílias e amigos. Em meio a esse cenário tão tenebroso, no último dia 07 de julho de 2021, a cidade de Jacareí, representada pela família Silva Aguiar, pela Escola Municipal Silvio Silveira Mello Filho, a Comunidade Católica São João Maria Vianey, e por outros tantos, passou pela dor extrema da perda da querida professora Giseli Silva Aguiar, falecida precocemente aos 41 anos, em decorrência de complicações geradas pela COVID-19.

Através do presente texto, expressamos nosso carinho, respeito e admiração pela professora Giseli, bem como celebramos o fato de que o seu múltiplo legado na vida de tantas pessoas será eternizado através da nomeação desta linda creche.

 

O primeiro aspecto que mencionamos a respeito da querida professora Giseli diz respeito à sua vida familiar. Desde os parentes mais próximos até os mais distantes, era perceptível a capacidade de comunhão e aglutinação de Giseli, sempre imbuída do espírito da paz, da confraternização e do afeto. Tais características serão melhor delineadas a partir de algumas histórias e de alguns depoimentos que aqui reunimos.

A história da professora Giseli Silva Aguiar começou durante a sua gestação, em 1979. Sua mãe, Maria das Graças Silva Aguiar, a caminho de uma consulta de pré-natal, viu uma mulher vestida com uma camiseta que tinha a seguinte mensagem: “Giseli: uma mensagem de amor”. Naquela ocasião, a dona Maria das Graças – conhecida por muitos como “dona Dadá” – não sabia o sexo do bebê que carregava consigo, porém, guardou o nome e frase, e já estava decidida: se fosse menina, a criança receberia o nome de Giseli.

  Ao final da gestação, Giseli nasceu no dia 16/03/1980, no hospital Santa Casa de Misericórdia de Jacareí, às 4:40 da manhã, na cidade de Jacareí-SP. Ela era a terceira filha de dona Dadá e do senhor Jorge Aguiar, também já falecido. Aos 10 meses, Giseli deu seus primeiros passos, e com 3 anos de idade caiu da cadeira quebrou o seu dentinho. Sempre foi uma criança calma e alegre. Sua comida preferida era angu, caldo de feijão, abóbora madura e, depois de adulta, gostava de comer couve manteiga no almoço. No ano 1983, a música “Coisinha do pai” fazia sucesso, e seu pai, Jorge Aguiar, dançava aquela canção com a sua filha caçula, colocando seus pés sobre os dele, para guiá-la; era só alegria e, assim, a música já entrara em sua vida na infância.

 

“No dicionário de Giseli, sonho e determinação eram palavras que rimavam com fé, um dos atributos mais inabaláveis que ela possuía.”

 

  Aos 5 anos de idade, Giseli foi para a pré-escola e, com 7 anos, iniciou primeiro ano do Ensino Fundamental, na Escola Municipal Professor Sílvio Silveira de Mello Filho, concluindo o Ensino Médio na Escola Estadual Professor Dorothoveo Gaspar Vianna. Sempre focada nos estudos, Giseli raramente pedia ajuda para tarefas e atividades, e nunca reprovou.

  Quando terminou o ensino básico, a professora Giseli decidiu ser catequista, monitora de crisma na igreja católica que frequentava. Além disso, fez aulas de violão e, com o salário obtido em seu primeiro emprego – em uma empresa de equipamentos de telecomunicações –, comprou seu instrumento e começou a tocar na comunidade São João Maria Vianney. Posteriormente, optou por servir cantando e fez uma canção em devoção a São João Maria Vianney, em parceria com a irmã Ilda. Juntas, elas acreditaram no crescimento da igreja. Motivada por sua mãe, Giseli passou a participar a desempenhar a função de ministra da eucaristia e serviu na pastoral da saúde, pela paróquia Santa Cecília, de Jacareí-SP.

No campo educacional, a professora Giseli, oriunda de família humilde, estudava insistentemente para conseguir uma bolsa pelo ENEM e cursar a graduação em Pedagogia, pois desde a adolescência falava que seria professora ou juíza. Conseguiu a bolsa pelo ENEM e iniciou a graduação em Pedagogia na Universidade Anhanguera de Jacareí-SP, tendo concluído o curso em abril de 2010. Já em 2011, foi aprovada em um concurso da prefeitura de Jacareí-SP, tornando-se professora I. Ao longo de sua carreira, a professora Giseli trabalhou na escola EMEF Prof. Sílvio Silveira de Mello Filho, de agosto de 2011 até julho de 2021, mesma escola onde havia estudado quando criança. Mesmo já exercendo a profissão, a professora Giseli continuou estudando, fazendo vários cursos de capacitação, indo a palestras, e também cursou a licenciatura em Geografia. Aliás, um dos seus planos de médio prazo era lecionar Geografia, mais um dos seus sonhos ceifados pela COVID-19.

O fato de ser uma pessoa extremamente dedicada aos estudos e imbuída na realização de novos projetos fazia de Giseli uma grande influenciadora entre os membros de sua família. Esse aspecto da personalidade de Giseli é ressaltado por sua querida irmã, Janaína, que relembra o papel de Giseli na formação acadêmica de seus filhos Kelly e Matheus, incentivo que Giseli dava a todos os seus sobrinhos, primas e primas. A exemplo disso, temos o seguinte depoimento proferido por sua sobrinha Kelly, que viveu com Giseli até o seu triste falecimento:

Tia Giseli foi mais que uma tia, mas também uma amiga e protetora. Sempre se preocupou com a minha saúde e meu bem-estar, e principalmente com os meus estudos. Ela incentiva todos os seus sobrinhos a estudar, para conquistar um espaço de realização profissional. Desde a minha infância ela acompanhava os meus estudos, auxiliando-me nos deveres escolares. Se hoje sou formada, é porque ela ficou no meu pé, e sei que tudo isso foi para o meu bem, e sempre será.

Sempre presenciei minha tia estudando em seu quarto e, à distância, pensava: “por que estudar tanto?” Vejo que o que ela queria era aprimorar seus conhecimentos. A tia Giseli nunca desistia de seus alunos. Na pandemia, por exemplo, ela teve de mudar a maneira de se comunicar com os estudantes e, por isso, ficava no pé deles, conversa com os pais etc. Enfim, ela não desistiu de nenhum aluno e cumpriu até o último dia o juramento feito à profissão a que se dedicou. (Kelly, depoimento)

Assim como Kelly, o depoimento de Natália Venancio, prima e grande amiga de Giseli, também mostra que a chama professoral de Giseli foi uma marca indelével de sua participação na trajetória de seus entes queridos. Natália relata que os conselhos de Giseli foram essenciais para que ela optasse por fazer a graduação em Ciências Biológicas, mesmo diante das dificuldades impostas pelo curso. Giseli também exerceu um papel fundamental para Natália fizesse uma segunda graduação em Pedagogia, tendo sido recentemente aprovada em um concurso público na área, ou seja, colhendo um fruto de uma semente plantada pela estimada prima-amiga-irmã-professora. Natália conclui o seu depoimento com as seguintes palavras:

Concluo este pequeno texto dizendo o quão importante foi e sempre será a Giseli, a minha Gi, a incentivadora de sonhos, a melhor fotógrafa, minha madrinha, minha professora, enfim, essa mulher excepcional que merece muito esta homenagem, pois ela, mais do que ninguém, amava ensinar, desde seus alunos até seus amigos, de uma forma muito amorosa e gentil […] (Natália, depoimento)

Conforme destacamos anteriormente, Giseli também teve atuação marcante junto à sua comunidade religiosa, a igreja católica São João Maria Vianney. Nesse espaço, desempenhou uma série de funções, tais como: salmista, ministra, cantora, catequista. Um de seus companheiros nessa jornada foi André, que lembra com carinho do dom da palavra que Giseli possuía e o seu amor pelo ensino. A desenvoltura oratória de Giseli também foi salientada por Sandra, uma grande parceira de Giseli na vida comunitária. Ela relata que, uma certa vez, haveria uma homenagem ao padre Messias pela passagem do seu aniversário, mas Giseli não poderia comparecer à missa. Ainda assim, escreveu um texto para homenagear o padre, texto este que foi lido por Sandra. De acordo com ela, durante a leitura do texto, padre Messias mal conseguia segurar a emoção, e Sandra sentiu-se muito feliz de ser uma intérprete da mensagem que estava no coração de Giseli. Sandra lembra com muito carinho da atuação de Giseli na área musical da igreja, pois foi a nossa querida professora quem compôs a canção em louvor ao santo padroeiro da comunidade, São João Maria Vianney. No depoimento de Sandra, vemos mais um exemplo da figura professoral de Giseli: segundo Sandra, Giseli sempre incentivava seus irmãos da comunidade a buscar fazer sempre o melhor, a superar as expectativas que eles tinham a respeito de si, descobrindo, nessa trajetória, seus múltiplos talentos. Foi por intermédio de Giseli que Sandra começou a tocar violão e a cantar na igreja, mesmo diante de sua timidez inicial. Essa história nos mostra que, mesmo não estando mais presente com sua bela voz, Giseli deixou sementes que germinaram e brotaram, mantendo a área musical daquela comunidade.

Dentre as marcantes características de Giseli, sua irmã, Janaína, destaca o seu caráter sonhador e determinado. E, no dicionário de Giseli, sonho e determinação eram palavras que rimavam com fé, um dos atributos mais inabaláveis que ela possuía. A esse respeito, seu primo, Wellington, destaca um dos últimos diálogos que travou com Giseli, cujo tema era justamente o cenário da pandemia de COVID-19. Àquela época, Wellington estava extremamente pessimista com tudo o que vinha ocorrendo, e Giseli, em contraste, o exortava a ter fé e esperança, pois tudo iria passar. Para nós, familiares e amigos de Giseli, é muito triste pensar que ela não teve a chance de ver o fim da pandemia, não teve a oportunidade de retornar à sala de aula, não pôde mais uma vez desvelar o seu lindo sorriso por detrás da máscara. Entretanto, nós, que tivemos o privilégio de conviver com ela – com o nosso anjo, nas palavras de sua irmã Janaína –, temos a certeza de que, do lugar de paz a partir do qual agora nos observa, Giseli está ecoando versos semelhantes aos de Martinho da Vila:

Canta canta, minha gente.

Deixa a tristeza pra lá.

Canta forte, canta alto.

Que a vida vai melhorar.

Nosso desejo é que a esperança que Giseli tinha na vida, nas pessoas e na educação seja a bússola a guiar a todos que passarão por esta creche que, a partir de hoje, tem a honra de levar o seu nome.

Giseli da Silva Aguiar, sempre presente em nossos corações.